sábado, 26 de maio de 2007

ISTO NÃO É DIVERSÃO - nem era pra ser.

Contenha-se, confessarei o que se passa por dentro. Por dentro de todos os nervos, músculos, artérias e todas essas coisas que só param com a morte. Ou que nos matam por nunca parar.
Parece comum a fila do banheiro de um bar. Parece comum aquele rapaz que passa pó no rosto. Não é novidade aquele outro que inspira todo pó que cai. É triste aquela garota que te olha com olhar de pena. Pena de si. Pena de mim por não ter pena dos outros. Viver lamentando a falta de carinho. E a falta de dinheiro para o álcool. E a falta do álcool pára o ar.

- Esse está vazio? - disse ela com olhar distante. Olhar úmido e claro. Agressor e desarmado.
- Não, mas você pode ir na minha frente, se quiser.
- Não quero ser problema na sua vida também...

Na fila do banheiro as pessoas são mais unidas. São mais íntimas.
A decisão de entrarmos juntos não foi minha. Juro. Talvez tenha sido o inconsciente-coletivo. Talvez o não-amor que evaporava por seus olhos. Talvez a carência que escorria com meu suor.
Não há melhor maneira de se encontrar um amor. No esgoto. Ao lado dele. Com o cheiro. Todo o ralo e todos os insetos e roedores.
É de lá que vêm todos os amores. E todos os amantes.

- De onde vem toda a paixão? - acende um cigarro, ainda nua.
- Sei para onde foi. Foi pra longe, longe do meu lado. Com a foice. Quando acreditei que tudo era fato consumado.
- Sua paixão não vem com o prazer?

Paixão e prazer não combinam. Só para os farmacêuticos, que sabem dosar os ingredientes nas medidas certas.

- Meu prazer vem com você. Serviço completo. Como todas as histórias que já foram derramadas nesses lençóis.
- Como a última inocência que derramei em seu cetim?
- E todas as dores e gemidos, grudados nele.

Ela levantou, se vestiu. Foi à torneira e, nela, se afogou.
Voltou ao ponto de partida. No banheiro. No esgoto. Entre todos os odores. Sob todo o excremento.

Depois de anos, ainda me pergunto como foi que tudo aconteceu. Aconteceu tão rápido. Não houve aquela coisa bonita do amor. Que amor? O amor que se foi com a descarga.
Uma cerveja. Outra dose de conhaque. O frio me mata... não o frio externo, o interno. Interno naquele músculo que não pára de bater.
Outro banheiro, outra fila. Outras pessoas; novas histórias. E, quem sabe, outra morte.
E assim, através do mundo, ou da noite. Que giram os dias, se combinam. Que repete. Erram e nos enterram. E nos repetem.

segunda-feira, 14 de maio de 2007

ALCOOLISMO E NOSTALGIA

Por toda a existência, vidas se unem ou carregam de si poucas coisas. Que nada significam.
Como um jovem escritor, que leva consigo seus textos mal explicados, inacabados. Seus contos trocados.
Se para alguns animais a vida se resume em caçar, procriar e morrer. Para o ser humano, se resume em encontrar alguém pra amar, sofrer e morrer. E amar por sofrer. Sofrer por amar. Morrer, por se estragar.
Como um jacaré que mora no esgoto. Se afoga em seus vícios. Faz de tudo para encontrar um motivo. Os vícios são mal-vistos e vestidos. Vestem suas fantasias, os levam por caminhos impressionantes que, no fim, voltam ao esgoto.
Como um alcoólatra, que da vida sabe tudo, mas nunca vive nada. O tempo inteiro embalsamado. Parado. Morto em frente o balcão, com um copo na mão. Um corte profundo no coração.
Como aquela que se foi. Fez questão de abandonar. Assassinou por tabela o seu amor. Hoje passa os dias no colchão. Nostalgia não lhe serve mais, deu lugar à depressão.
E a boneca de pano. Como alguém que sonha. Tem planos. Murchando junto às violetas. Que, na janela, olham o mundo inteiro sem poder se soltar da terra.
Assim como o ser humano, que da terra não sai. E sobe pelas paredes para olhar por trás do muro. E descobrir que, do outro lado, há apenas um espelho.


sábado, 5 de maio de 2007

ENJÔO

"Às vezes me sinto tão cheio. Quero te dizer que me sinto bem...". Todas as cervejas acabaram, junto com a esperança. Aos poucos, se sufoca com seu último cigarro, que saboreia devagar e aproveita cada milésimo de prazer que a fumaça lhe proporciona.
No bar, parece que a vida tem muito mais sentido. Que cada gota de álcool torna seus problemas mais suaves. Seus desabafos mais audíveis. Ha...
Mas agora, que não há mais cerveja, a realidade vem à tona. Ela realmente o deixou, sem motivos, simplesmente o largou. Todo ser humano tem seus direitos reservados. O direito de enjoar de alguém, na hora que quiser, do jeito que entender.
Depois do sexo ela abriu uma vodca, encheu um copo-de-requeijão e se destruiu. No segundo copo, abriu a boca. Vomitou em cima dele tudo que estava entalado. Todas as verdades omitidas, todas as mentiras fantasiadas, todas as tragédias digeridas.
Na verdade, tudo isso se resumiu numa simples frase: "Enjoei. Você me enjoou".
Sem a cerveja, essas palavras martelam em sua cabeça. Machucam cada vez mais. Agora ele anda em direção ao mar, vai fundo, vai longe. E deixa ser levado pelo destino - ou pelas ondas.
Amanhã, quando ela acordar - com ressaca - vai descobrir que não era esse enjôo que sentia. Que seu enjôo era vício. E que seu vício a transformou em assassina.