sábado, 11 de outubro de 2008

SEM VOCÊ ATÉ O TÉDIO ADQUIRIU UM SABOR

Ato 1: Poder Com Glória.

Olha só a flor que pintei pra você. Tem espinhos, mas eles nunca vão te machucar. Nem a mim, eu acho.
Ela não é bonita, mas, bom, alguma coisa tem de existir para contrastar com a sua beleza.
Eu passo horas e horas admirando seus olhos, por mais que na vida real sejam só alguns segundos. É lindo o jeito que consigo enxergar sua alma. Ver você por inteira. Te chamar por inteira, sem dizer uma palavra. Sem piscar.
Feche os olhos, vamos deitar. Não há tempo para dormir. Queria ficar aqui pra sempre.
E seu calor desumano me tira do mundo novamente.
Viro a cara pra não ver meus erros, e me perco só de olhar pro céu. Mas você segura minha mão, e eu vejo que, se for pra se perder, que seja os dois. Estrelas podem complicar o nosso caminhar.
Qual vai ser o plano de amanhã? Nenhum, melhor improvisar. E nós somos mestres nisso.
Essa flor que te dei nunca vai murchar, eu prometo, apesar de ser um quadro de inverno. Natureza morta.


Ato 2: Depressão.

Cadê você? Estou trancado em seu quarto e penso em pular dessa janela outra vez.
Você rasgou meu quadro e me colou no seu diário. Virou a página.
Eu gostaria tanto de segurar seu coração novamente. Só que seus olhos se fecham pra mim.
Não tenho culpa de ter feito de você minha morfina, minha anestesia. Acabei me viciando. E Nenhum vício é bom, foi o que aprendi. Aprendi nada, eu nunca aprendo.
Caralho, como é ruim ter óleo queimando seu peito por dentro o dia inteiro.
Você foi se esconder no seu passado, e acabou me levando pro meu. Engraçado que, depois de velho, meu passado parece mais sombrio, e eu pareço mais criança, encostado ali no canto, choramingando porque a brincadeira acabou.
Não é justo te culpar pelo seu enjôo. Eu sei. Mas o que é justo?
Use-me ao menos uma vez, prometo: nada irá mudar. Esqueça. Você não tem nada pra lembrar. Mas eu lembro de cada detalhe, e vivo todos na minha cabeça. Como se fosse a primeira vez.
Sua fome passou e você fez o que qualquer um faria, nessa situação. Foi embora. Não precisa olhar pra trás, seria vergonhoso se você me visse desse jeito.
Vou acender outro cigarro e tomar só mais dezenove garrafas. Não fique assustada, não vou te ligar. Não quero atrapalhar seu sonho. Seu sono.
Que pesadelo. E é sempre o mesmo, pra mim.
Tá bom. Vou fingir que está tudo bem, ninguém vai reparar.
Só você, porque você vê minha alma, não vê? O problema é que seus olhos se fecharam pra mim.
Vamos deitar.
Esqueça, de novo. Serei paciente e vou tentar ser um pouco menos mortal. Só não serei eu mesmo.
Agora é sua vez.